Gente de ChapadaLugar de contar histórias de gente comum, gente de verdade, chapadenses que fazem a diferença, gente que batalha, muda as coisas, transforma de algum jeito o mundo ao redor e faz de Chapada dos Guimarães um lugar melhor pra se viver.
Terramicina para desinflamar e cicatrizar; boldo para curar o estômago; capim cidreira para acalmar; sabugueiro para afastar a dor. E no quintal de dona Faustina ainda tem pé de canela, alecrim, melão de são caetano, chuchu... E as frutas? Manga, mamão, maracujá, abacate, limão, graviola, café... E ainda tem galinhas e um coelho, ali, no centro de Chapada dos Guimarães.
Faustina Pereira da Silva se despediu dos chapadenses na última quinta-feira (15), aos 96 anos – mas no registro estava “apenas” 94 –, depois de uma longa vida de saúde e de resistência. Partiu de insuficiência respiratória, pois o coração, que tanto amou e cuidou dos outros, ficou fraco.
Apesar de que “problema de coração” era comum na família, foi a mais longeva de 11 irmãos: a irmã mais velha se despediu de outros nove e convivia apenas com a caçula, que hoje se aproxima dos 70 anos.
Esta é a primeira edição da coluna Gente de Chapada com uma homenagem póstuma, que ouve outras pessoas para contar sobre alguém tão relevante para a cidade. E não podíamos deixar de agradecer dona Faustina.
Ela, com seu quintal frutífero e sua fé, que tanto acolheu os chapadenses.
Cláudia Regina da Costa Monteiro, uma das quatro netas dela – aquela que morou com ela por tantos anos – que nos contou sobre dona Faustina.
Nascida em Chapada dos Guimarães, na região do Quilombo, é filha de mineiros que vieram trabalhar nas terras do Cel Rafael de Siqueira, há cerca de um século. Dona Faustina morou naquelas terras, no Jamacá e, há 50 anos, no centro da cidade, casa simples que construiu com seu marido, Benedito da Costa Monteiro.
Eu conheci a casa: no quarto, um altar, na sala, um quadro de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. No quintal, ervas medicinais, frutas, galinhas. A imagem de dona Faustina – católica devota, sabedoria popular, cura pela natureza.
Nossa anfitriã, a Cláudia, não esconde a saudade, mas tem a certeza de que ela foi para um plano melhor. “A saudade é muito grande, mas só o fato de saber que ela está nos braços de Deus e que saiu desta peste [a pandemia do novo coronavírus], a gente fica tranquila”. E lembra: “as pessoas amavam a paçoca de pilão que ela fazia”.
Dona Faustina se preservou e não passou pelo susto de ser infectada pela covid-19. Quando morreu, já havia tomado a segunda dose 15 dias antes. Enquanto esteve internada na UPA de Chapada, fez sequencialmente os testes e, felizmente, não pegou o vírus. Partiu de uma vida longa, partiu pelo corpo cansado.
Seus saberes quilombolas, inclusive, compuseram um filme dirigido por Amauri Tangará, em 2016, quando ele desenvolveu um projeto de cinema na escola com os alunos da Escola Municipal Abinel Freitas Pereira, pelo Programa Mais Cultura nas Escolas. Nossa personagem apresentou brincadeiras e cantigas de roda de sua infância na produção “A Conspiração”.
O ator Ivan Belém foi vizinho de dona Faustina, logo que se mudou para Chapada, há uns seis anos. Até participou do aniversário dela de 90 anos. Lembra da ex-vizinha com muito carinho. “Uma pessoa muito querida, uma vizinha muito carinhosa, afetuosa”.
E, claro, destacou sua marca na medicina natural: “um quintal maravilhoso, sempre cuidou dele com muito esmero, repleto de ervas medicinais, frutas, galinhas, gostava de ofertar isso para os vizinhos. Foi um privilégio ter morado pertinho dela”.
Cláudia ainda destacou mais uma figura ilustre que conviveu com dona Faustina: o prefeito de Chapada dos Guimarães Osmar Froner. “Minha vó gostava muito dele, ele foi muito presente na nossa vida. A chegada dele na cidade foi aqui na casa da minha vó. E ele nos apoiou muito do começo ao fim”, conta, sobre o tratamento de saúde de dona Faustina.
Vovó Faustina teve três filhos, quatro netas, sete bisnetos e incontáveis filhos e netos de coração. Vá em paz, dona Faustina!
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